that's how strong my love is
Berlioz, compositor francês do século 19, em suas memórias:
"Dois anos atrás, numa época em que o estado de saúde de minha esposa fazia-me incorrer em muitas despesas, mas ainda havia alguma esperança de melhora, sonhei, uma noite, que estava compondo uma sinfonia, e no sonho eu a ouvi. Ao acordar na manhã seguinte, pude lembrar todo o primeiro movimento, que era um allegro em lá menor em compasso dois por quatro [ ... ] Ia sentar-me à mesa para escrevê-lo quando pensei: "Se eu for, serei levado a compor todo o resto. Minhas idéias sempre tendem a expandir-se hoje em dia, e essa sinfonia pode muito bem ser numa escala enorme. Passarei talvez três ou quatro meses nesse trabalho (levei sete para escrever Romeu e Julieta), e durante esse tempo não farei nenhum artigo, ou no máximo uns poucos, e minha renda consequentemente diminuirá. Quando a sinfonia estiver escrita, estarei fraco o suficiente para ser persuadido pelo meu copista a mandá-la copiar, e com isso imediatamente entrarei numa dívida de 1000 ou 1200 francos. Assim que tiver as partituras, serei atormentado pela tentação de ouvir a obra tocada. Darei um concerto, cuja receita mal cobrirá metade dos custos - isso é inevitável hoje em dia. Perderei o que não tenho e ficarei sem dinheiro para cuidar da pobre doente, não poderei mais pagar minhas despesas pessoais nem a estada do meu filho no navio no qual ele em breve embarcará". Estremeci com tais idéias, larguei a pena e pensei: "E daí? Amanhã já terei esquecido!". Naquela noite a sinfonia tornou a aparecer-me e ressoou obstinadamente em minha cabeça. Ouvi o allegro em lá menor distintamente. E mais: pareci vê-lo escrito. Acordei num estado de excitação febril. Cantei o tema para mim mesmo; sua forma e caráter agradaram-me imensamente. Eu estava a ponto de me levantar. Mas os pensamentos que tivera antes voltaram e me seguraram. Quedei-me ali, empedernindo-me contra a tentação, agarrado à esperança de esquecer. Por fim, adormeci; e quando tornei a acordar, a lembrança da música desaparecera para sempre."
Uma não-canção de amor - é o que isso é.
"Dois anos atrás, numa época em que o estado de saúde de minha esposa fazia-me incorrer em muitas despesas, mas ainda havia alguma esperança de melhora, sonhei, uma noite, que estava compondo uma sinfonia, e no sonho eu a ouvi. Ao acordar na manhã seguinte, pude lembrar todo o primeiro movimento, que era um allegro em lá menor em compasso dois por quatro [ ... ] Ia sentar-me à mesa para escrevê-lo quando pensei: "Se eu for, serei levado a compor todo o resto. Minhas idéias sempre tendem a expandir-se hoje em dia, e essa sinfonia pode muito bem ser numa escala enorme. Passarei talvez três ou quatro meses nesse trabalho (levei sete para escrever Romeu e Julieta), e durante esse tempo não farei nenhum artigo, ou no máximo uns poucos, e minha renda consequentemente diminuirá. Quando a sinfonia estiver escrita, estarei fraco o suficiente para ser persuadido pelo meu copista a mandá-la copiar, e com isso imediatamente entrarei numa dívida de 1000 ou 1200 francos. Assim que tiver as partituras, serei atormentado pela tentação de ouvir a obra tocada. Darei um concerto, cuja receita mal cobrirá metade dos custos - isso é inevitável hoje em dia. Perderei o que não tenho e ficarei sem dinheiro para cuidar da pobre doente, não poderei mais pagar minhas despesas pessoais nem a estada do meu filho no navio no qual ele em breve embarcará". Estremeci com tais idéias, larguei a pena e pensei: "E daí? Amanhã já terei esquecido!". Naquela noite a sinfonia tornou a aparecer-me e ressoou obstinadamente em minha cabeça. Ouvi o allegro em lá menor distintamente. E mais: pareci vê-lo escrito. Acordei num estado de excitação febril. Cantei o tema para mim mesmo; sua forma e caráter agradaram-me imensamente. Eu estava a ponto de me levantar. Mas os pensamentos que tivera antes voltaram e me seguraram. Quedei-me ali, empedernindo-me contra a tentação, agarrado à esperança de esquecer. Por fim, adormeci; e quando tornei a acordar, a lembrança da música desaparecera para sempre."
Uma não-canção de amor - é o que isso é.
15 Comments:
ele podia ter escrito de noite.
ou no lugar das memorias.
- falou a menina q nao escreveu nem gravou nada decente nos ultimos meses.
Não gravou porque ainda não recebemos as "fitas". Ehehe
Bela passagem. Por isso eu gosto de fazer as coisas simples e rápidas. Ehehe
Outros tempos...Hoje o cara gravava e depois via no que dava.
Se não me engano, tem algo desse belo trecho no ótimo Alucinações Musicais, livro do Oliver Sacks.
gostei... abração!
John meu caro! É fato que vocês estarão em Londrina em junho? Finalmente poderei matar saudades de um show de vocês?
Uma pessoa como Berlioz não podia ser tão prática e artística ao mesmo tempo, pois na prática era obrigado a deixar um amor em benefício de outro. Até me senti mulher com este meu comentário... já passou!
bela passagem. qual a fonte???
Fonte: o Márcio acertou na mosca: Alucinações Musicais, do Oliver Sacks. Não citei porque a fonte primeira, é claro, são as própria memórias do Berlioz.
oi john, tudo bom?
uma pequena intromissão, rapidinho..
então, esses dias assisti no cinema um curta muito bacana, saliva, e quando as letrinhas subiram, vi que a música final era um som, mt bom por sinal, seu e da takai (cocteau, certo?)
enfim, tô catando que nem doida aqui, onde eu escuto?
:)
Berlioz,Berlioz
Esse mano sabia das coisas...
Quando penso em fazer um disco(que estou fazendo)tenho esse mesmo tipo de preocupacao que ele.
E se o povo gostar?Sera que vou ter que sair do meu conforto e ir la tocar pra eles,afinal o 'Milton' ja dizia que todo artista tem de ir aonde o povo estah...
fazer ou nao eis a questan.
John, tenho escutado por esses dias uma banda espanhola chamada Presuntos Implicados... e nao sei porque, nao paro de pensar em algumas letras dessa banda na voz da Fernanda.. ia ficar show... enfim... abraço... (o som de vocês a cada disco está melhor, parabens !)
Olá. Ontem eu estava no show da Fernanda aqui na Concha Acústica da UFC. Realmente muito bonito.
Você estava usando uma Variax 700? De longe parecia, e a variedade dos timbres reforça.
No mais, parabéns pelo belo show.
parece que foi escrito ontem, desconsiderando o fato de que hoje existe estudio caseiro e phones poderosos para não incomodar os doentes.
isso aconteceu mesmo?
pareceu uma passagem de algum livro maluco qualquer, do tipo Dostoievisk(?)
mas massa!
componhe entao pô!
Que pena! Com certeza o allegro em lá menor era fenomenal!
É por isso que o prefeito da minha cidade diz: não perca a oportunidade, cavalo arreado não passa na sua porta duas vezes. Em geral o ser humano pensa muito e age pouco, levado pelo pessimismo.
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